tentativa de praticar a escrita a partir da criação de personagens antropomorfizados (ou não) que precisam encarar o tédio do dia-a-dia

12 de fev. de 2008

O monstro do conteúdo original

O monstro do conteúdo original é aquele ser mitológico/imaginário/alucinógeno/consensual (como preferir) que nos persegue até quando olhamos por debaixo da cama. Nas férias, é assim: ele sempre ataca. O monstro do conteúdo original está em todos os lugares. Tentamos escrever sobre alguma coisa, e percebemos que estamos apenas repetindo o que já foi dito, feito macaco. Tentamos comentar sobre o que já foi dito, e os comentários não acrescentam em nada, apenas reverberam argumentos. Em situações de família, ele também ataca. É como se estivéssemos condenados a (re)contar sempre as mesmas histórias, a rir sempre das mesmas piadas.

O monstro se alimenta e cresce, em efeito bola de neve, de maneira incontrolável. Abro o Word, e lá está ele. Parto para o Bloco de Notas, à procura de algo menos high tech, e ele também aparece. Tento escapar absolutamente da tecnologia, mas mesmo com um bloquinho de papel e uma caneta, lá está ele, imenso, ainda maior, boquiaberto, pronto para de novo me atacar. Mesmo que use um papiro e dois pauzinhos, ele ataca, rápido e certeiro. Tento contar histórias para mim mesma, eu e minha imaginação, mas não encontro finais felizes. Os personagens imaginários estão condenados a lutar, lutar, lutar, sem nunca vencer – andam, andam, andam, e não chegam a lugar algum.

Às vezes o monstro quer ser irônico e tenta pregar peças na gente. Ele nos deixa criar uma, duas linhas de texto. Quando estamos prestes a nos entusiasmar por ter de volta a criatividade, ele volta a atacar, deixando-nos com um arquivo de criações inacabadas, à espera de novos sopros de criatividade, capazes de requentá-los para seguirem em frente e se tornarem idéias concretas, com final. Há os posts que entram no ciclo da reedição sem fim, e, dos que escapam, quase todos são textos que não saem do nível meramente auto-referencial.

Mas o pior mesmo não é a inevitabilidade do ataque do monstro. O pior é que desde o princípio já sabemos como se livrar dele. O primeiro passo para a cura é reconhecer que nem tudo é original. Ou melhor, reconhecer que simplesmente adicionar a nossa perspectiva aos fatos já torna qualquer narrativa original. O original não está em criar algo completamente novo a cada dia. O original pode estar em uma singela nova recombinação de elementos já existentes...

8 de fev. de 2008

Refém da autoconsciência

- Será que na fica muito idiota postar isto no blog?

- Ah, ninguém vai dar bola, vá em frente.

- É que, sei lá, tipo assim... Sou eu mesma, sabe?

- Mas e não é você, sempre, em seu blog?

- É. Cada post do blog acaba revelando, inevitavelmente, uma faceta de mim.

- Então, qual o problema?

- Ah, mas não é a mesma coisa. Os outros posts não são assim.

- Assim como?

- Assim... como é que vou explicar?

- Qual o problema, hein? Não é legal poder postar o diálogo?

- Acho que é justamente esse o problema.

- Poxa, diálogos são tão legais. E não ficam restritos à literatura. Podem aparecer também – por que não? – em posts de blog.

- É, mas os diálogos ficcionais são um pouquinho menos assustadores do que o diálogo com uma autoconsciência.

- Você está com vergonha de mim (que, na verdade, sou você mesma)?

- Não, não, longe disso. É só que... não parece nada normal travar um diálogo hipotético consigo mesma, e ainda mais postar isso, em um blog. O que os outros irão pensar?

- Ah, bobagem isso. Você anda meio paranóica, Gabriela. Pensando demais, agindo de menos. Aja!

- Mas... não é tão simples. Há vários fatores a se considerar.

- É simples, sim. Larga de frescura e posta logo isso. Vai em frente, arrisca.

- Não sei não. E olha bem quem está me aconselhando a fazer isso.

- Ora, quem melhor para lhe dar um conselho do que você mesma?

- Igual, igual...

- Deixa de ponderações e posta logo, senão...

- Senão o quê?

- Senão vou assumir o controle e passar a agir por ti.

- Não, não. Deixa que eu controlo as coisas por aqui, ok? Você só cumpre o seu papel de permitir que haja diálogo comigo mesma – o que possibilita a ponderação de argumentos.

- E, na qualidade de ponderadora, exijo que você poste logo.

- Ok, lá vai.

- Logo!

- Ok, ok. Foi. Deve ser algo inédito. Um post publicado a pedido da autoconsciência.

Histórias passadas

Outras informações

  • - Nas cinco primeiras histórias, a ênfase foi na criação e descrição de personagens. A ênfase atual é nos diálogos, e/ou na elaboração de um final para os textos.
  • - As sete primeiras histórias postadas fazem parte de um grupo temático arbitrariamente criado e intitulado "Amores impossíveis".