Firula, uma grande hipopótama
[atenção: este texto ainda precisa de ajustes :P]
Firula era uma hipopótama como as demais: meio cinza, meio rósea, e bastante pesada. Ela tinha um sorriso largo e vivia semi-submersa nas águas rasas de um lago da floresta. Para qualquer lado que olhasse, só encontrava hipopótamos. Sua vida também era típica de um ser de sua espécie: deslocava-se em bando, alimentava-se de plantas, e no resto do dia ficava de bobeira no lago, com o corpo metade mergulhado n'água, metade saltando pra fora (sua vida, basicamente, resumia-se a se fingir de pedra). Como uma rotina dessas não só parecia como era de fato bastante tediosa, Firula precisava encontrar maneiras de superar o tédio do dia-a-dia. E foi numa dessas tentativas de encontrar o que fazer que a hipopótama acabou se tornando obcecada pela boa forma.
Assim, enquanto os outros hipopótamos vivam a comer e a descansar, Firula não perdia uma oportunidade de fazer ginástica. Algumas vezes, ela corria de um lado a outro do lago, com as patas submersas. Em outras situações, aproveitava o tempo livre para nadar. Isso quando ela não decidia praticar hidroginástica no meio do lago — e provocava situações hilárias, pois seus saltos aquáticos, mal-calculados e desengonçados, espirravam água para todos os lados, vindo a atrapalhar a soneca dos demais.
No início, Firula até comia tal qual os demais hipopótamos; entretanto, assim que terminava de ingerir algum alimento, ela metia a larga pata achatada dentro da boca gigante e forçava que seu organismo expelisse tudo de volta.
O grande problema é que o padrão de beleza dos hipopótamos constitui-se justamente em ser gordinho. Hipopótamos são grandes, por natureza. Firula queria usar o padrão de peso de outros animais; queria ter um corpo sarado como aqueles dos animaizinhos mostrados pela mídia.
E assim instalou-se em Firula um verdadeiro "complexo de Barbie", que se manifestava principalmente de duas formas: ora comia desesperadamente, o que gerava nela um grande sentimento de culpa, seguido de uma verdadeira indução de vômito (bulimia); ora comia direitinho, fazia exercícios obstinadamente, e, ao se olhar no espelho, por mais que tivesse perdido peso, se sentia enormemente gorda (e qual hipopótamo não é?) — em um claro sinal de anorexia. E assim, oscilando entre os dois pontos, Firula tornava-se cada vez mais obcecada pela própria imagem. Ou melhor, tornara-se a eterna perseguidora de uma imagem ideal que só existia em sua mente, e, quanto mais dela se aproximasse, mais longe de atingi-la estaria. Chegar ao peso que consideraria ideal era, de fato, técnica e paradoxalmente impossível: quanto mais Firula emagrecia, mais lamentava-se e cria estar acima do peso.
Durante muito tempo, tudo o que Firula fazia, pensava ou comia era imediatamente associado com a idéia de perder peso. Ela se sentia gorda o tempo todo, e seu objetivo era emagrecer, não importasse o quanto sofresse com isso. Em pouco tempo, foi simplesmente parando de comer, ficando obcecada com dietas e alimentação saudável, pois simplesmente se achava gorda demais quando se via no espelho. Depois de tudo isso, é claro, finalmente chegou o dia em que Firula enfim apaixonou-se pela própria imagem refletida em um espelho, ao ponto de tal excesso de amor próprio transformar-se em narcisismo. Para manter o peso atingido, que considerava o ideal (embora muito abaixo do normal), Firula simplesmente parou de comer. Mas cada vez que deixava de ingerir novos alimentos, seu organismo reclamava a falta de nutrientes essenciais. Ela ignorava os sinais, até que algum tempo depois foi impossível resistir e Firula desmaiou. Não fosse a prontidão de Marcos, o macaco (que passava por ali por acaso, é claro), não teria tido condições de chegar até o hospital e morreria asfixiada (ou afogada — o que acontecesse primeiro). Ele achou estranho ver uma hipopótama de barriga para cima no lago, e resolveu verificar o que tinha ocorrido.
Firula tentou questionar os padrões de beleza da sociedade moderna impostos pela mídia. Mas acabou sofrendo de uma profunda anorexia, que levou meses e meses para ser tratada, e por muito tempo ainda manifestou seqüelas. Mas ela finalmente aprendeu, às custas de muito sofrimento, que todo excesso, nos cuidados com o corpo, ou em qualquer aspecto da vida, quando transcende os limites do racional e foge aos padrões normais de comportamento, acaba por ser prejudicial.
Nenhum comentário:
Postar um comentário